Sabedoria Ramatis

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domingo, 5 de fevereiro de 2012

A dualidade do sincretismo na crendice popular: orixás santificados, exus demonizados – lll





PERGUNTA: - O avanço das concepções judaico-cristãs-católicas sobre as diversas religiões, inclusive a umbanda, associado à imputação de "culpa" aos seus adeptos, não contribuiu para a instalação e manutenção de um estado de consciência infantil nas coletividades envolvidas, diante das verdades espirituais?

RAMATÍS: - O sentimento de culpa deve conduzir-vos a um saudável e constante amadurecimento fundamentado na reavaliação de atitudes. O que o catolicismo fez ao longo da História e que se encontra ainda muito arraigado no inconsciente coletivo foi estabelecer uma terrível dominação religiosa com o lema "fora da Igreja não há salvação". Essa proposição doutrinária culposa opõe-se ao legado crístico deixado no Evangelho de Jesus, que, ao contrário de aprisionar consciências, as liberta.
A contextualização histórica da incrustação de culpa na consciência humana foi um avanço evolutivo que depurou alguns ritos religiosos. Antes dos hebreus visionários e pioneiros, os "deuses" se satisfaziam com sacrifícios sanguinolentos e não tinham nenhuma noção de moral crística. Bastava um fiel degolar uma cabra ou arrancar o coração de um carneiro para um daqueles bezerros de ouro fazer chover ou fertilizar as mulheres. O próprio Jeová se regozijava com a bajulação concretizada nas oferendas. Era um "deus" belicoso, dos exércitos, que submetia seus filhos a provas de fé crudelíssimas, como aquela por que passou Abraão, quase tendo que imolar o próprio filho.
Esse modo de se relacionar com as divindades não foi exclusivo de uma única etnia no orbe terrestre, manifestando-se nas tribos africanas e silvícolas em diversas localidades geográficas, algumas até com rituais de antropofagia, em que comer o inimigo fortificava o espírito, simbolicamente não muito diferente de ingerir o corpo amigo de Jesus na eucaristia católica. Eis que vieram os profetas antecedendo o Rabi da Galiléia em sua mensagem libertadora. Significativamente, Isaías bradava com voz de trovão, falando em nome de um único Deus vivo: "Lavai-vos, purificai-vos, tirai de diante dos meus olhos a maldade de vossas ações! Cessai de fazer o mal! Aprendei a fazer o bem, procurai o que é justo, aliviai a opressão, fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva".
A moral contida no Evangelho de Jesus e magistralmente exaltada em O Evangelho Segundo o Espiritismo, que é universal e cósmica, tem aplicabilidade às várias religiões terrícolas, mesmo que o conceito de mal ou bem seja limitado por vossa temporalidade material, que ocasiona mudanças de hábitos e valores constantes.
A moralidade preconizada por Jesus é mediadora, equilibrando-se entre "a moda" de não se arrepender de nada dos cultos africanistas e ritos tribais antigos e a total submissão culposa dos novos católicos, dois extremos que não se aplicam à consciência coletiva atual. Ela busca a unidade no conjunto dos indivíduos e da sociedade, convergindo para todas as doutrinas da Terra, mesmo que o processo de religiosidade se subdivida em múltiplos pedaços, qual colcha de retalhos, como se fossem gavetas de um único armário que não se comunicam.
Em verdade, na umbanda, o retorno à unidade religiosa requer dos cidadãos amadurecimento espiritual; exige a quebra da infantilidade fragmentada, promovendo a união na diversidade, em que as diferenças não significam desigualdades. Esse discernimento é vagaroso, mas não impossível.
Há uma relação direta do sensitivo com o sagrado, em que os transes mediúnicos vivenciados nos terreiros pelo intercâmbio com os espíritos enviados dos orixás trazem do inconsciente a unidade cósmica de outrora, já vivida nos planos fora da materialidade. O sentimento de serdes Um com o Pai vos conduz a uma mudança gradativa de consciência e à percepção de que toda a expressão de religiosidade na Terra converge para Ele, o Uno, o Incriado Eterno. Tudo é parte desse Todo, tornando-se irrelevantes as formas das religiões instituídas na Terra diante da unicidade dessa essência religiosa, cósmica e convergente, tão intensa na seara umbandista que extrapola a dualidade culposa imposta pelos infantis dogmas judaico-católicos, ainda tão presentes nos ritos sincréticos.
O saber profundo de cada uma das crenças da Terra é análogo: indica um tipo de relação com o Divino em que as partes integram um conjunto maior, sem que se desmereçam reciprocamente ou priorizem umas às outras. Assim a umbanda, por sua universalidade cultural e ritualística, caminha a passos largos, porém discretos, rumo à instalação e à manutenção de um estado de consciência madura e unificada, de fraternidade amorosa entre as coletividades que a seguem, envolvidas na busca das verdades espirituais.



PERGUNTA: - Existem "umbandistas" que preconizam liberar a umbanda de Jesus e do "ranço" católico e espírita, alegando que os africanos e o culto à natureza nunca veneraram o Evangelho do Divino Mestre. O que podeis nos dizer sobre isso?

RAMATÍS: - Procuram negar Jesus numa tentativa tão-somente de africanizar a umbanda. Entendemos que isso é um reducionismo e uma incompreensão do significado cósmico do Cristo. A essência crística de Jesus, de Buda, Maomé, Ghandi, Krishna, entre outros enviados, vai além da religião católica, que é símbolo em vosso inconsciente de ser cristão. É importante deixar o "biblismo" e o "igrejismo" de lado e enfocar vossa mente na essência da mensagem do Evangelho de Jesus, tão bem lembrada pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas na data da anunciação, do culto nascente. Para isso, não precisa haver imagens e podeis gradativamente "dessincretizar" a umbanda, libertando-a das ladainhas e dos oratórios católicos.
A mistura da umbanda com as práticas mágicas populares ocasiona uma fricção nas consciências dos prosélitos nesse início de terceiro milênio, criando uma crise de identidade em algumas expressões sacerdotais, levando-as a posturas abruptas para se perpetuarem no poder. Elas impõem, assim, um senso de urgência irreal, querendo a exclusão violenta do que as desagrada, como preconizam os "pais-de-santo" famosos da "umbanda", perdidos nas iniciações coletivas regiamente pagas, disfarçados entre "mistérios" ocultos, veladamente esfaqueando um galo aqui, um bode acolá, a pedido do falso "exu" que vilipendia o Verdadeiro.
A umbanda é universal e não se limita a uma raça ou etnia: africana, negra, índia, vermelha, branca ou amarela. Na verdade, existe uma frustração crescente de certos "umbandistas" na busca de referenciais para seus atos primitivos: fazer a cabeça com sangue, deitar para o santo, além de raspagens e matanças.
Para terdes a convicção interna que não falseia, o fundamento imprescindível à essência da umbanda é mover vossos espíritos para a caridade. É óbvio que isso não combina com sacrificar animais, da mesma forma como é-inconcebível idealizardes Jesus oficiando entre os apóstolos com faca afiada à mão entre berros de galos e animais de quatro patas que serão cortados com precisão mortal em nome do Pai.
Cada vez mais é preciso indicar o que é umbanda. A partir disso, cada um pode então concluir o que não é a Divina Luz.


 
(Origem: A Missão da Umbanda – Ramatís/Norberto Peixoto – Editora do Conhecimento)

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