Pergunta: Devemos, então concordar com a música
barata, que só atende aos sentidos físicos e que prolifera no seio da
civilização atual, numa demonstração de profundo mau gosto? Não se deveria
privar a mocidade dessa oportunidade infeliz, de se entregar desenfreadamente à
admissão dos estilos musicais modernos, onde o histerismo conduz aos mais
deploráveis ridículos e às cenas mais degradantes?
Atanagildo: Recordo-me de minha última existência, no Brasil, quando também
era muito comum aos velhos censurarem, alarmados, os. entusiasmos e os prazeres
da juventude, esquecidos de que eles também haviam se excedido nos mesmos
requebros, quando moços. A velhice traz o cansaço e a desilusão, e permite que
se examine o passado de um modo panorâmico, observando as vantagens e as
desvantagens que se registraram na trajetória finda; então os velhos se tornam
sentenciosos e emitem juízos severos sobre os jovens, porque só aí avaliam o
seu próprio tempo perdido.
O surto do "jazz", que se registrou entre o povo americano do norte, não só prognosticou para muitos puritanos o fim do mundo, como ainda sofreu a maior condenação dos velhos da época, que pretendiam evitar o mais completo desbragamento da mocidade obsidiada por tal espécie de música. No entanto, era apenas um novo tipo de musicalidade que fluía da alma emotiva do povo e aflorava através da carne moça, resistindo a todas as barreiras que lhe opunham nos púlpitos dos templos, sobrepondo-se a todas as censuras e preconceitos da sociedade sentenciosa. Mais tarde, essa música gritante e estrepitosa recebeu melhor tratamento, de compositores inteligentes, terminando por ingressar nas orquestras afidalgadas e se fazer intérprete dos sentimentos de muitos daqueles que a combateram no seu início.
Hoje, o "jazz" já teve oportunidade de ser acolhido sob as abóbadas dos melhores teatros onde já vibraram os acordes das composições dos maiores gênios da música humana, visto que, embora pelas veias dessa música agitada circule a sonoridade estrepitosa que ainda mexe com o corpo físico, ela também traduz, por vezes, em linguagem terna e melancólica, as ansiedades e os sonhos de um povo culto. Naquela época, quem poderia prognosticar que, da rudeza selvática do "jazz" maluco, formar-se-ia o alicerce da agradabilíssima "Rapsódia Azul", de Gerschwin? Eis porque não chegareis a soluções justas destruindo as coisas que surgem no ambiente físico do vosso mundo, mas sim melhorando sempre aquilo que pede a vossa habilidade, sentimento e carinho, em vez da violência e destruição. Mesmo os instrumentos vulgares, que de princípio eram desprezados como preferidos das classes inferiores, também evoluíram em suas expressões técnicas e ingressaram no seio das execuções afidalgadas.
O violão, considerado instrumento dos malandros nas serenatas, e a rudimentar gaita de boca, à semelhança do que já aconteceu com a clarineta, o trombone e o bombo, também já merecem os mais acalorados aplausos quando interpretam difíceis trechos dos mais consagrados compositores da música clássica. A aplicação inteligente da eletricidade, que lhes dá o homem atual, tem aprimorado os mais rudes instrumentos musicais, como o violão, o órgão e o bandolim elétricos, fazendo lembrar o que ocorreu na metrópole do Grande Coração, quando se conseguiu desenvolver ali a "luz interior" na instrumentação musical, do que resultou grandioso progresso.
O surto do "jazz", que se registrou entre o povo americano do norte, não só prognosticou para muitos puritanos o fim do mundo, como ainda sofreu a maior condenação dos velhos da época, que pretendiam evitar o mais completo desbragamento da mocidade obsidiada por tal espécie de música. No entanto, era apenas um novo tipo de musicalidade que fluía da alma emotiva do povo e aflorava através da carne moça, resistindo a todas as barreiras que lhe opunham nos púlpitos dos templos, sobrepondo-se a todas as censuras e preconceitos da sociedade sentenciosa. Mais tarde, essa música gritante e estrepitosa recebeu melhor tratamento, de compositores inteligentes, terminando por ingressar nas orquestras afidalgadas e se fazer intérprete dos sentimentos de muitos daqueles que a combateram no seu início.
Hoje, o "jazz" já teve oportunidade de ser acolhido sob as abóbadas dos melhores teatros onde já vibraram os acordes das composições dos maiores gênios da música humana, visto que, embora pelas veias dessa música agitada circule a sonoridade estrepitosa que ainda mexe com o corpo físico, ela também traduz, por vezes, em linguagem terna e melancólica, as ansiedades e os sonhos de um povo culto. Naquela época, quem poderia prognosticar que, da rudeza selvática do "jazz" maluco, formar-se-ia o alicerce da agradabilíssima "Rapsódia Azul", de Gerschwin? Eis porque não chegareis a soluções justas destruindo as coisas que surgem no ambiente físico do vosso mundo, mas sim melhorando sempre aquilo que pede a vossa habilidade, sentimento e carinho, em vez da violência e destruição. Mesmo os instrumentos vulgares, que de princípio eram desprezados como preferidos das classes inferiores, também evoluíram em suas expressões técnicas e ingressaram no seio das execuções afidalgadas.
O violão, considerado instrumento dos malandros nas serenatas, e a rudimentar gaita de boca, à semelhança do que já aconteceu com a clarineta, o trombone e o bombo, também já merecem os mais acalorados aplausos quando interpretam difíceis trechos dos mais consagrados compositores da música clássica. A aplicação inteligente da eletricidade, que lhes dá o homem atual, tem aprimorado os mais rudes instrumentos musicais, como o violão, o órgão e o bandolim elétricos, fazendo lembrar o que ocorreu na metrópole do Grande Coração, quando se conseguiu desenvolver ali a "luz interior" na instrumentação musical, do que resultou grandioso progresso.
Pergunta:
- Mas não vos parece, então, que a música vulgar, exclusivamente endereçada à
carne, é sugestivo convite para o desregramento dos moços modernos?
Atanagildo: Tudo é questão de boa ou má intenção da alma, pois há um sentido
evolutivo em todas as expressões da vida, que propicia ao homem desenvolver os
motivos de beleza e utilidade, em lugar de apenas censurar aquilo que não lhe
causa mais prazer, e portanto detesta. A prova disso é que a Natureza, por si
mesma, não falsifica qualquer dos seus produtos, mas o homem o faz: o animal
fornece-lhe o leite puro, e a videira lhe dá a uva sadia, mas o cidadão terreno
mistura água no leite e álcool no suco da uva. Mesmo aquilo que o homem
considera desprezível e imundo, a Natureza não despreza: o lixo e os detritos
que atirais às raízes dos vegetais ou dos arvoredos frutíferos, ela os
transforma em seiva nutritiva ou suco saboroso; os despojos cadavéricos, que
depositais nas entranhas dos sepulcros, ela os transforma em verdadeiras
reservas de elementos químicos, que depois devolve à circulação para serem aproveitados
como novos recursos de vida.
O homem, que é portador de melhores recursos do que a Natureza, dotado do raciocínio que o liga à razão superior, indubitavelmente deveria proceder sob idêntica forma, pelo menos em relação às coisas que considera inoportunas ou prejudiciais. É razoável censurar-se a expansividade demasiada da juventude moderna, quanto à sua preferência pelos ritmos gritantes, passos banais e esfuziantes, que transformam os moços em cópias caricatas e modernas dos bugres das florestas brasileiras. No entanto, cumpre notar que. o que realmente traz prejuízos à alma é sempre li intenção com que se procede na vida, pois há malfeitores que tramam as piores coisas dentro até dos templos religiosos, profanando a sua atmosfera de beleza espiritual, enquanto há outras criaturas que mais se aviltam, ainda, no silêncio das alcovas viciosas.
O homem, que é portador de melhores recursos do que a Natureza, dotado do raciocínio que o liga à razão superior, indubitavelmente deveria proceder sob idêntica forma, pelo menos em relação às coisas que considera inoportunas ou prejudiciais. É razoável censurar-se a expansividade demasiada da juventude moderna, quanto à sua preferência pelos ritmos gritantes, passos banais e esfuziantes, que transformam os moços em cópias caricatas e modernas dos bugres das florestas brasileiras. No entanto, cumpre notar que. o que realmente traz prejuízos à alma é sempre li intenção com que se procede na vida, pois há malfeitores que tramam as piores coisas dentro até dos templos religiosos, profanando a sua atmosfera de beleza espiritual, enquanto há outras criaturas que mais se aviltam, ainda, no silêncio das alcovas viciosas.
É
possível que no seio turbulento das danças estrepitosas, que atendem às
expansões da carne, muitos jovens permaneçam com o espírito regrado e fraterno,
como é muito comum entre os aldeões dos
Alpes, entre as tribos européias e no seio das danças folclóricas dos eslavos.
Há que se exigir, primeiramente, a modificação interior da alma, pois a luz
interna do espírito sadio sempre pode rodear de pureza as mais incongruentes
turbulências das danças modernas. Então sempre haverá segurança e equilíbrio
para o indivíduo, graças ao sentido de alta moral que se desenvolve na
intimidade da própria alma, independente de códigos e preconceitos exteriores
do mundo profano. Muitas
vezes podemos depositar mais confiança na honestidade e inocência dos batuques
ruidosos e da gritaria efusiva dos selvagens, em suas danças pejadas de saltos
e berros, do que na convencional festividade que muitos civilizados ociosos
promovem à "meia luz", nos cabarés luxuosos, regada pelo uísque e
outros venenos que mais excitam as intenções subversivas da alma.
DO
LIVRO: “A SOBREVIVÊNCIA DO ESPÍRITO” RAMATÍS, ATANAGILDO/HERCÍLIO MAES –
EDITORA DO CONHECIMENTO.
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