Sabedoria Ramatis

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sexta-feira, 1 de junho de 2012

Despachos e "iniciações" com sacrifícios nos ritos e cultos sincréticos distorcidos - Vlll









PERGUNTA: Como as práticas mágicas populares que se formaram com o sincretismo, repercutiram nas oferendas desses ritos e cultos distorcidos erroneamente  confundidos como de umbanda pela sociedade, que exige cada vez mais uma postura ecológica, de preservação dos animais, da natureza e do meio ambiente urbano?


RAMATÍS: - A transmissão oral de conhecimentos foi enfraquecida de geração a geração, fazendo a comunidade afro-brasileira perder os referenciais históricos de sua religiosidade durante o processo de inserção social, após a alforria dos escravos. Ao longo do tempo, e de forma crescente, muitas das oferendas e iniciações originais das religiões de matriz africana foram se transformando em despachos e rituais descaracterizados, grosseiramente distorcidos, [5] tudo sendo entendido, popularmente, como ritos da umbanda, em especial por sua abrangência sincrética com outras religiões.
Todo e qualquer sacrifício animal ritualístico com derramamento de sangue contribui para o fortalecimento das baixas zonas umbralinas que tangenciam o orbe terrícola. Por outro lado, compreender a origem de certas práticas, inserindo-as num contexto histórico, sem julgamentos belicosos, irá vos conduzir ao raciocínio, à melhor compreensão dos descalabros que acontecem na atualidade, em nome de uma falsa umbanda e dos pretensos "exus". Discernireis o que ocorreu nas metrópoles ao longo do tempo e as mudanças ambíguas que estruturaram as práticas mágicas populares, com seus ritos e cultos sincréticos distorcidos. Uma transformação enganosa e significativa disso ocorreu no padê, [6] rito totalmente distorcido ao sair do interior das senzalas: o sacrifício deixa de ser interpretado como um intermediário entre o sagrado e o profano, entre os orixás e os filhos de fé, como o era originalmente nos ritos primários das nações africanas antigas e seus clãs tribais. Além de se cultuar erradamente "exu", porque ele seria cruel, ciumento, podendo de forma personalista encerrar a cerimônia litúrgica ou interromper a dança dos "orixás"manifestados, a demonização se acentua no que se refere ao lado mágico da divindade, transformando o padê original em ebó, oferenda adaptada: como o resto do padê deve ser jogado fora, na rua, os sacerdotes venais supuseram que um pouco do axé (força mística) ali continuava a palpitar no galo sacrificado. Logo, essas lideranças religiosas mal-intencionadas transformaram intensivamente o ebó oferenda religiosa divinatória de "exu" em ebó oferenda mágica de obsessores pagos. Daí em diante, supostamente, as forças maléficas de "exu" estão no animal sacrificado que é colocado na encruzilhada da rua por onde o alvo ou desafeto a ser destruído passará. Isso acontecendo, trará infelicidade e desgraça ao indivíduo visado. Este é o cerne da questão, o pano de fundo do triste e deprimente cenário que verificais diuturnamente em vossas vias públicas, especialmente ao acordar nas manhãs de sábado, poluídas com galos, cabritos, cães e sapos sacrificados, expostos à putrefação diante de cidadãos sonolentos e apressados rumo ao trabalho, que descuidosamente tropeçam em garrafas de cachaça, velas pretas e vermelhas, vísceras, penas, pêlos e farofa abundantes.

[5] "O sangue é a essência da vida. Assim como ele gera o axé, pode prejudicá-lo; se houver excesso de sacrifícios, isto provocará saturação. Quando fazemos uma oferenda ou realizamos trabalhos, eles permanecem por um período necessário na Casa. Após esse período, eles são despachados em locais apropriados. A demora nesses despachos, gera uma atração negativa, já que eles devem ser consumidos pelo 'povo da rua' (espíritos menos evoluídos)". Trecho extraído de Os Orixás e o Segredo da Vida - Lógica, Mitologia e Ecologia, de Mario César Barcellos, 4ª edição, Editora Pallas, pp. 134-135, ref. 13-26,2005.

[6] Padê: rito propiciatório que ocorre antes do início das cerimônias públicas ou privadas das religiões afro-brasileiras e que consiste na oferenda a "exu" de animais votivos sacrificados, alimentos e bebidas, para que este não perturbe a festa e faça as vezes de mensageiro na obtenção da boa vontade dos "orixás" que serão chamados a descer; popularmente conhecido como despacho.


 (Origem: “A Missão Da Umbanda” Ramatís/Norberto Peixoto – Editora do Conhecimento)

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