PERGUNTA:
Certa vez
dissestes que estando encarnado no tempo de Jesus, tivestes ensejo de
conhecê-lo pessoalmente, quando visitastes a Hebréia. Poderíeis dizer-nos algo
dessa vossa experiência junto ao Mestre?
RAMATÍS:
— Embora a nossa afirmação não vos sirva de prova
irrefutável, mas apenas um enunciado de confiança, nós gozamos a felicidade de
um encontro pessoal com Jesus, na Palestina, quando nos filiávamos a certa
escola filosófica de Alexandria Assim pudemos conhecer algo dos ensinamentos da
"Boa Nova" e do "Reino do Céu" que Ele pregava entre os judeus
e pagãos. Quando o encontramos, ele usava uma túnica de esmerada brancura e um manto
azul celeste, cabelos soltos nos ombros; e calçava umas sandálias de cordões
amarrados nos tornozelos. Vimo-lo subir a encosta do morro, seguido pelos seus
diletos discípulos e caminhando com infinito cuidado, a fim de não pisar sobre
as pétalas aveludadas das anêmonas dos prados, que floresciam prodigamente,
atapetando o solo com suas flores brancas, lilases e tarjadas de um roxo
brilhante. Sob um bosque de ciprestes havia uma pedra avantajada e cômoda,
emergindo entre os tufos de capim verde e florinhas silvestres, que estremeciam
sob o afago da brisa suave. Voltando-se para &
multidão que se formava a seus pés, encosta
abaixo, Jesus primeiramente espraiou o seu olhar sereno sobre a paisagem. Sua
alma parecia deleitar-se com os vinhedos, os ciprestes, os limoeiros, as
oliveiras e a brancura dos campos de trigo agitando a sua cabeleira de espigas
sobre o verde repousante do vale do Jordão. Tudo estava engalanado na força da
estação primaveril; o campo cobria-se de flores e até dos troncos apodrecidos
surgiam florinhas encarnadas, roxas, azulíneas e amarelas. A paisagem era
empolgante de beleza, de cores e de luzes, pois seria difícil encontrar cenário
tão fascinante quanto o da Galiléia na sua explosão de flores e perfumes inebriantes
no ambiente campestre!
Acomodando-se sobre a rocha atapetada de musgos, Jesus espraiou o
seu olhar sereno sobre a multidão, que ardia de ansiedade por ouvi-lo, enquanto
João lhe estendia o "xale de rezar", peça tradicional entre os
galileus, com o qual ele cobriu sua cabeça. Em seguida abençoou aquela gente
silenciosa e começou a falar pausadamente, porém, dando relevo às frases e
imagens que definiam suas idéias, enquanto os seus ouvintes estavam contagiados
por sublime emoção. Era imenso o poder verbal de Jesus, pois impressionava
profundamente as criaturas que lhe bebiam as palavras como um néctar dos
deuses! Sua voz era pausada, repleta de doçura e de uma sonoridade musical
cristalina, jamais ouvida por nós; as palavras vibravam no ar como lantejoulas vivas
espargindo sons maviosos e tecendo um manto de harmonia a envolver sob o céu
dadivoso a turba hipnotizada pelo verbo salvador. Espírito equilibrado e de
visão exata, suas palavras ajustavam-se hermeticamente ao pensamento enunciado
e conseguiam despertar emoções cujo eco ficava vibrando para sempre na alma dos
seus ouvintes.
As mãos do meigo Rabi eram de molde irrepreensível; em suas
pregações e gestos, elas pareciam mansas pombas configurando lhe no espaço os
contornos do pensamento, e avivando as suas palavras amorosas. Naquele dia em
que buscáramos conhecê-lo, o Mestre explicava a parábola do
"Semeador" (3) pois ele costumava pregar o ensinamento de
conformidade com o ambiente e as circunstâncias que .o tornassem mais vivo e
entendível (4). Escolhia cada parábola de acordo com o tipo de auditório, pois
a sua elevada intenção era oferecer a solução para os problemas de ordem moral
e social daqueles que o ouviam!
(3) Mateus, XII. vs. 1 e 23; Marcos, VI, vs. 1 e 20; Lucas, VIII,
vs. 4 e 15.
(4) Nota de Ramatís:
Quando Jesus falava aos campônios expunha a parábola do semeador, do grão de
mostarda, do joio e do trigo; aos pescadores referia-se à parábola dos peixes;
num banquete ou festividade, falava dos talentos, do tesouro enterrado; entre negociantes
e especuladores, da pérola de grande valor, o credor incompassivo, os dois
devedores; entre magnatas, servia-se das parábolas do rico insensato, o rico e
Lázaro; entre os assalariados explicava-lhes a parábola dos servos inúteis, dos
trabalhadores da vinha e do mordomo infiel; entre homens de lei mencionava o
juiz Iníquo e entre os religiosos a história do publicano e o fariseu.
Rodeado pelos campos floridos, cujo ar doce e perfumado traía o odor
dos figos, das uvas, dos limões e dos pêssegos maduros, trazido nas asas do
vento brando e fresco, Jesus comovia até às lágrimas, ao explicar que o
semeador lançou suas sementes no solo duro, na rocha, na terra espinhenta;
porém, finalmente, obteve êxito no bom terreno! O lugar escolhido para essa
predica era de magnífica inspiração, pois além da florescência dos narcisos do
campo, do fogaréu de papoulas vermelhas e das anêmonas safirinas, lilases e
ametistas, que coloriam toda a planície de Genesaré, sem deixar um só desvão do
solo descoberto, o quadro formoso completava-se pelo dorso esmeraldino
levemente empado do mar da Galiléia, a despedir faíscas à luz do sol, que
formava dourada cortina translúcida à altura da crista nevada dos montes mais
altos.
Jamais poderíamos esquecer a veemência e a fé com que Jesus
enunciava os seus ensinamentos, ainda prematuros e arrojados aos judeus
subordinados à sua crença dogmática mosaísta. A gente da Galiléía, rude e
ignorante, mas dotada de sentimentos compassivos, sublimava-se ante a predica
do seu querido Rabi, pois ele realmente vivia em si mesmo aquilo que ensinava.
Não era um sistema político, nem filosófico; porém, doutrina moral e religiosa,
que tocava o coração e pedia a aprovação.do sentimento, muito antes do
raciocínio da mente.
Quando retomamos para Alexandria e consultamos os nossos maiorais a
respeito das atividades do Rabi Jesus, que tanto nos havia impressionado, todos
eles foram unânimes em confirmar que, malgrado a sua aparente insignificância
na época, na realidade ele era o maior revolucionário espiritual descido à
Terra, a fim de sintetizar os ensinamentos dos seus precursores e redimir a humanidade!
(Do Livro: “O Sublime Peregrino” Ramatís/Hercílio Maes –
Editora do Conhecimento)
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