PERGUNTA: Por que motivo
considerais que o homem se inferioriza ao selvagem, na alimentação carnívora, se ele
usa de processos eficientes, que visam evitar o sofrimento do animal no corte?
Não concordais em que o homem também atende à sua necessidade de viver e se
subordina a um imperativo nutritivo que lhe requer uma organização industrial?
RAMATÍS: — O selvagem, embora feroz e instintivo, serve-se da
carne pela necessidade exclusiva de nutrição e sem transformá-la em motivos
para banquetes e libações de natureza requintada; entre os civilizados, entretanto, revivem esses mesmos apetites do
selvagem mas, paradoxalmente, de modo mais exigente, servindo de pretexto para
noitadas de prazer, sob as luzes fulgurantes dos luxuosos hotéis e restaurantes modernos.
Criaturas ruidosas, álacres, e que
apregoam a posse de genial intelecto, devoram, em mesas festivas, os cadáveres dos
animais, regados pelos temperos excitantes, enquanto a orquestra famosa executa
melodias que se casam aos odores da carne carbonizada ou do cozido fumegante!
Mas sabei que as poéticas e sugestivas denominações dos pratos, expostas nos
cardápios afidalgados, não livram o homem das consequências e da responsabilidade
de devorar as vísceras do irmão inferior!
Apesar dos floreios culinários e do cardápio de iguarias “sui
generis”, que tentam atenuar o aspecto repugnante das vitualhas do apetite
desregrado humano! Aqui, a designação de “dobradinha à moda da casa” apenas disfarça
o repulsivo ensopado de estômago de boi; ali, os sugestivos “miúdos à milanesa”
são apenas retalhos de vesículas e fígado, traindo o sabor amargo da bílis
animal; acolá, os “apetitosos rins no espeto” não conseguem sublimar a sua
natureza de órgãos excretores da albumina e da uréia, que ainda se estagnam sob
o cutelo mortífero. Embora se queira louvar o esforço do mestre culinário, o “mocotó
à européia” não passa de viscoso mingau de óleo lubrificante de boi abatido; os
“frios à americana” não vão além de vitualha sangrenta, e a “feijoada completa”
é apenas um nauseante charco de detritos cozidos na imundície do chouriço
denegrido, dos pés, películas e retalhos arrepiantes do porco, que ainda se
misturam à uréia da banha gordurosa!
E evidente que se deve desculpar o bugre ignorante, que
ainda se subjuga à nutrição carnívora e perverte o seu paladar, porque a sua alma
atrasada ignora a soma de raciocínios admiráveis que ao civilizado já é dado
movimentar na esfera científica, artística, religiosa e moral. Enquanto os banquetes
pantagruélicos dos Césares romanos marcam a decadência de uma civilização, a
figura de Gandhi, sustentado a leite de cabra, é sempre um estímulo para a
composição de um mundo melhor.
PERGUNTA: Deveríamos,
porventura, violentar o nosso organismo físico, que é condicionado milenarmente
à alimentação de carne? certos de que a natureza não dá saltos e não pode
adaptar-se subitamente ao vegetarianismo, consideramos que seria perigosa qualquer
modificação radical nesse sentido. O nosso processo de nutrição carnívora já é
um automatismo biológico milenário que há de exigir alguns séculos para uma
adaptação tão insólita. Quais as vossas considerações a esse respeito?
RAMATÍS: Não sugerimos a violência orgânica para aqueles que
ainda não suportariam essa modificação drástica; para esses, aconselhamos
gradativamente adaptações do regime da carne de suíno para o de boi, do de boi
para o de ave e do de ave para o de peixe e mariscos. Após disciplinado exercício
em que a imaginação se higieniza e a vontade elimina o desejo ardente de
ingerir os despojos sangrentos, temos certeza de que o organismo estará apto
para se ajustar a um novo método nutritivo de louvor espiritual. Mas é claro que tudo isso pede por começar e, se desde já não efetuardes
o esforço inicial que alhures tereis de enfrentar, é óbvio que hão de persistir
tanto esse tão alegado condicionamento biológico como a natural dificuldade
para uma adaptação mais rápida. Mas é inútil procurardes subterfúgios para
justificar a vossa alimentação primitiva e que já é inadequada à nova índole
espiritual; é tempo de vos asseardes, a fim de que possais adotar novo padrão
alimentício. Inegavelmente, o êxito não será alcançado do modo por que fazeis a
substituição do combustível de vossos veículos; antes de tudo, a vossa alma
terá que participar vigorosamente de um exercício, para que
primeiramente elimine da mente o desejo de comer carne.
Muitas almas decididas, que já comandam o seu corpo físico e
o submetem à vontade da consciência espiritual, têm violentado esse automatismo
biológico da nutrição de carne, do mesmo modo por que alguns seres extinguem o
vício de fumar, sob um só impulso de vontade. Também estais condicionados ao
vício da intriga, da raiva, da cólera, do ciúme, da crueldade, da mentira e da
luxúria; no entanto, muitos se libertam repentinamente dessas mazelas, sob
hercúleos esforços evangélicos.
E reconhecendo a debilidade da alma humana para as
libertações súbitas, e preparando-vos psiquicamente para repudiardes a carne, que
temos procurado influenciar o mecanismo do vosso apetite, dando-vos conselhos
cruamente e de modo ostensivo, de modo a que mais facilmente vos liberteis dos
exóticos desejos de assados e cozidos, que, na realidade, não passam de
rebotalhos e cadáveres que vos devem inspirar náuseas e aversão digestivas. Daí as nossas preocupações sistemáticas, em favor do vosso bem
espiritual, para que ante a visão, por exemplo, de dobradinhas “saborosas” que
recendem ao molho odorante, reconheçais, na verdade, as tétricas cartilagens
que protegem a região bronco pulmonar do boi, em cujo local se processam as
mais repugnantes trocas de matéria corrompida!
(Origem:
“Fisiologia Da Alma” – Ramatís/Hercílio Maes – Editora do Conhecimento)
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