Pergunta:
Isso quer dizer que estão certos os
comunicados mediúnicos dos espíritos desencarnados quando, em vez do Inferno e
do Diabo da teologia cristã, eles descrevem o "Umbral" das regiões
inferiores; não é assim?
Atanagildo:
Quanto a mim, posso vos assegurar que,
depois de desencarnado, não me foi possível encontrar o Céu com sua corte de
santos pronunciando extensas orações, nem mesmo as onze mil virgens em festivos
cânticos, da tradição popular. Felizmente, também não me defrontei com o
Inferno e os seus caldeirões ferventes, nem com qualquer bando de Diabos a
perambular pelo espaço. Eis porque considero bem exatas as descrições que, por
médiuns criteriosos, os espíritos têm feito das regiões do astral inferior,
onde tenho ido em excursões socorristas e sacrificiais, quer por motivo de estudos,
quer para retirar dali algum amigo ou alma aflita, que mereça o fraterno
socorro. Mas não posso deixar de registrar que, nessas regiões, encontrei
muitos espíritos de homens excessivamente mais experimentados em vinganças do
que o famigerado Diabo da Teologia, pois além de torturarem impiedosamente os
seus desafetos, ainda os impediam de qualquer esforço de renovação espiritual.
Não
se trata, porém, de entidades devotadas à maldade, com um ofício obrigatório,
ou que tenham sido atiradas às sombras por causa da ira divina, que são as
razões que se costumam invocar para justificar a existência e a rebeldia do Diabo.
Esses espíritos agem por sua livre e espontânea vontade, sob o mais sádico
desempenho artístico, como se fossem "virtuoses" da crueldade. São
almas ferozes, verdugos impiedosos e carrascos sem a menor partícula de
contemporização, pois extraem de suas vítimas a última gotícula de esperança e prolongam
o menor espasmo de sofrimento! Cobram-se da mais insignificante dívida e não toleram
o menor prejuízo, mesmo que tenha sido fruto da imprudência ou da ignorância de
suas infelizes vítimas. O que me impede a revolta diante de tais atrocidades é
saber da lógica da Lei Cármica, que demonstra não existirem injustiças,
dando-nos a certeza de que sempre terão fim tais sofrimentos e vinganças. E o
que nos consola é saber que esses barbarismos, quer durem minutos, horas,
séculos ou milênios, felizmente não passam de acontecimentos transitórios e
justos, pois em jubiloso futuro tanto algozes como vítimas hão de se unir em sincero
abraço de afeto e ternura, alçando o vôo definitivo para as regiões celestiais.
Isto posto, considero bem mais lógicas e sensatas as "regiões
umbralinas", ou do "astral inferior", que os espíritos costumam
descrever em suas mensagens mediúnicas – onde as almas expiam as suas próprias
criações infernais que imprudentemente alimentaram na vida física - do que o
pavoroso sofrimento, na eternidade, em um inferno criado pela vingança de Deus.
Verdadeiramente,
mais cedo ou mais tarde toda vítima libertar-se-á dos seus poderosos verdugos e
também dos seus próprios defeitos, reajustando suas culpas com a sua própria
consciência e merecendo então novos ensejos de desenvolvimento e ventura espiritual.
Atanagildo:
O inferno teológico é um produto
da imaginação lendária do passado religioso, adaptada à compreensão de uma
humanidade ainda atrasada. Daí o fato de se descrever o sofrimento no astral
inferior como um reinado de Belzebu, com as características das torturas
primitivas e dos castigos mais conhecidos e empregados naquela época. Para que
a humanidade ficasse impressionada - pois que de outro modo não o ficaria - foi
preciso dizer que os infelizes pecadores deveriam ser cozidos em caldeirões de
água, cera ou chumbo ferventes, e assados entre carvões e enxofre. É óbvio que,
se o Inferno fosse imaginado no vosso século atual, os religiosos poderiam descrevê-lo
como provido de todos os recursos científicos modernos, em matéria de
destruição, tais como instalação de cadeiras elétricas, bombas asfixiantes,
câmaras frigoríficas ou superaquecidas, e tudo que o cidadão do século XX
descobriu para aliviar a superpopulação do seu planeta...
Sem
dúvida, o Inferno eletrônico do século XX não só poderia dispensar os seus caldeirões
anacrônicos e anti-higiênicos, como também abandonar o sistema obsoleto de queima
de enxofre e carvão, cujo braseiro vultoso consome verbas astronômicas sem esperanças
de que Satã obtenha indenização por parte de pecadores já completamente falidos.
Sem
dúvida, o Diabo sentir-se-ia eufórico e venturoso, nesse Inferno modernizado e automático,
onde, para se moverem talhas, guinchos e vagonetes admiravelmente eletrificados,
bastar-lhe-ia um rápido acionar de botões, e todo o Inferno funcionaria na mais
efusiante sinfonia de gritos, berros e barulho de ventiladores e exaustores
elétricos, eliminando o cheiro da carne assada! A Ciência e a Indústria,
bastante desenvolvidas no vosso mundo, poderiam fornecer o aparelhamento de
torturas mais genial e eficiente para o Inferno, acomodando-o na conformidade
dos tipos, pesos e torpezas dos pecadores modernos. Acredito que os comodistas
e os ociosos teriam que repousar eternamente sobre confortáveis redes
anatômicas, elétricas; os exploradores do próximo rodariam de modo divertido
dentro de modernas máquinas de lavar roupa, mas repletas de água fervente, que lhes
arrancaria a pele sem danificar os órgãos; os avarentos seriam condenados a
contar falsários e os hipócritas ficariam se debatendo dentro de fornos
elétricos, aquecidíssimos, tentando abrir e fechar suas portas falsas e sem
saída; os coléricos e irascíveis seriam colocados incessantemente sob chuveiros
elétricos de água fervente; os cruéis seriam colocados em excelentes
churrasqueiras rodantes, enquanto os administradores relapsos e delapidadores do
patrimônio público ver-se-iam condenados a servir-se de poderosas canetas
eletrificadas, eternamente obrigados a encher cheques feitos de folhas de
aço...
Uma
vez que a própria Terra evolui, desde o seu cenário material até às realizações
mais prosaicas de sua humanidade, por que também não hão de evoluir o Diabo, o
Inferno e o Céu bíblicos, transformando-se para melhores condições? Quanto a
este último, não seria razoável que a alma terrena, já conhecedora das
magistrais obras de Beethoven ou de Mozart, terminasse se entediando contra os
anacrônicos tocadores de rabecas, as procissões e o cantochão litúrgico, que
ainda fazem sucesso num céu primitivo? Creio que a simples idéia de faltar no
céu o popular acordeão moderno já seria motivo suficiente para que a maioria dos
"fiéis" se desinteressasse do lendário Paraíso.
Do
livro: “A Sobrevivência do Espírito” Ramatís – Atanagildo/Hercílio Maes –
Editora do Conhecimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.